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Nunca se esqueçam

embro-me, como se fosse ontem, do calor escaldante do local onde nascemos. Eu e meus irmãos viemos ao mundo em um dia qualquer, entre milhares de outros nascimentos. O calor nos moldou.

Vocês não conseguem se lembrar de tudo enquanto recém-nascidos, não é mesmo? Nós conseguimos. Logo, foi necessário nos mudarmos. Não sabíamos o que o futuro poderia reservar para nós. Vocês sonham em ser médicos, advogados, policiais, professores. Nós não escolhemos nada. A vida escolhe pela gente.


Quando chegamos ao destino final, que surpresa tivemos em não enxergar nada. Absolutamente nada havia naquele local. Nos sentamos em um canto e passei a observar a movimentação. Passaram-se dias, horas, semanas e nada parecia mudar. Foi quando percebemos que alguns dos nossos estavam desaparecendo. O medo começou a fazer parte da nossa rotina. Notamos que vocês estavam utilizando nossos irmãos para uma causa maior. Quando chegou a minha vez, tentei relutar. Mas nem me mover conseguia. Fui realocado, preso, e me cobriram para que me tornasse ainda mais resistente. Percebi, então, que nunca mais conseguiria me mover. Por muito tempo me lamentei e sofri até perceber o que vocês haviam feito.


A cada dia podia aprender algo novo. Vi muitos de vocês crescerem, passarem por aqui e nunca mais voltarem. Acredito que estão num local melhor agora. Eu e meus irmão acolhemos vocês. Vimos suas brincadeiras, suas dificuldades e até mesmo romances infantis. Até o dia em que tudo mudou. Os sorrisos foram trocados por choro. A alegria se transformou em um medo constante. Eu, imóvel, acompanhei suas dores. Eu sou a estrutura física, construída por vocês para criar um ambiente de ensino, crescimento e liberdade. Quando foi que decidiram me transformar em abatedouro? Isso não está certo e nunca será esquecido.

Queria ter podido fazer alguma coisa, mas não pude. Me desculpem meus pequenos. Sofri com vocês, se pudesse também haveria chorado. Mas como mero tijolo que sou, de uma simples parede, em um pátio do Colégio Raul Brasil, não havia nada que eu pudesse fazer. Vocês me transformaram em um memorial e isso é bom. Nunca se esqueçam do que ocorreu aqui. Espero que outros muros ao redor do Brasil não tenham que presenciar, imóveis, a tragédia que vi aqui.

L

RETRATOS DA DOR

Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor
Retratos da Dor

Este álbum retrata a face externa dos muros das Escolas Raul Brasil (Suzano – SP) e Tasso da Silveira (Realengo – RJ), locais onde ocorreram os maiores massacres em colégios públicos do Brasil.

Nossa equipe de produção visitou ambas as escolas e registrou as mensagens deixadas pela comunidade, alunos e visitantes.

Saudade (cover) - Jeferson Junior
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"Mas o que ninguém ensina nem no livro nem na escola,
é lidar com a dor de ver alguém partir."

Saudade - Pedro Valença

Em memória

 "A dor de perder alguém é aquela que dói na alma, aquela que não passa, só é amenizada, mas que sempre será lembrada." Michel Benchimol

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